"O amor é a força mais sutil do mundo." -- Mahatma Gandhi

segunda-feira, 27 de junho de 2011

sexta-feira, 24 de junho de 2011



Ah, cumo era bão!


Sodade da criancice
nos festejo de São Juão,
o pai armava a foguera,
a mãe fazia quentão,
doce de abobra, canjica,
minduim, pipoca, pinhão,
inquanto nóis, fiarada,
varria tudo o terrero,
despois infeitava de frô,
de fita e de banderinha.

Quano tudo tava pronto
já era de tardezinha
e nóis ia se aprontá.
Tomava banho na tina,
ponhava ropa de festa
passava água de chero
e corria abri a portera
pos cunvidado que vinha:
Tião do Fole, Zé Pandero
e as famiage vizinha.

Pai acendia a foguera,
erguia o santo no mastro
despois sortava rojão.
O pessoá se juntava
tudo em vorta do artá
dano viva a São Juão
e a lovação prucedia
nos cunforme a tradição.
Só quano a reza acabava
mãe sirvia as cumilança
e os tocadô dava o toque
pa cumeçá a diversão.

Tano de barriga cheia
pai chamava as criança
pa ganhá forfe de cor
que agora num egiste mais.
Buniteza era vê
os foguinho culorido
que nóis acendia e girava
rodopiano no terrero
(só quem viu sabe cumo é)
inquanto os mais véio pruseava
e a moçada se adivertia
dançano o arrasta-pé. 

A festança era tão boa
que durava inté acabá
despois que o fogo arriava,
hora de pagá promessa,
de pulá a foguera em brasa
em homenage a São Juão,
que pur um ano inteirinho
num dexô fartá fejão
po sustento das famía,
nem tempo bão pro prantio,
seno a coieita bem farta
tamém do arroiz e do mio.

Sodade da criancice
nos festejo de São Juão,
dos tempo vivido na roça...
Ah! Cumo era bão!

                                                  Isabel Pakes



terça-feira, 21 de junho de 2011




 "Só o amor pode ser infinitamente dividido
e assim mesmo não diminuir."

                               Anne Morrow Lindbergh

Imagem Google

sábado, 18 de junho de 2011


Amo!


Amo a terra! Amo o sol! Amo o céu! Amo o mar!
...Amo a vida! Amo a luz! Amo as árvores! Amo
a poesia que escrevo e entusiasta declamo
aos que sentem como eu a alegria de amar!


Amo a noite! Amo a antiga palidez do luar!
A flor presa aos cabelos soltos de algum ramo!
Uma folha que cai! Um perfume no ar
onde um desejo extinto sem querer inflamo!


Amo os rios! E a estranha solidão em festa,
dessa alma que possuo multiforme e inquieta
como a alma multiforme e inquieta da floresta!


Amo a cor que há nos sons! Amo os sons que há na cor!
E em mim mesmo - amo a glória de sentir-me um Poeta
e amar imensamente o meu imenso amor!


J. G. de Araujo Jorge



terça-feira, 14 de junho de 2011



Haikai

Noite tão fria,
a rua vazia
e a lua cheia.

                                                    Isabel Pakes



segunda-feira, 13 de junho de 2011


Atende eu, Santontonho!


Santontonho,
o sinhô deve de tá alembrado
do trato que eu le fiz:
causo mandasse um amô pra eu,
tudos ano no seu dia,
cumo hoje to fazeno,
eu iá le banhá cum frô de laranjera
merguiada na bacia.

Eu to muito gardecida,
o sinhô feiz dereitinho a parte vossa,
ligerinho o Juca apareceu
e os dois zóio dele arrevirô
de aturdido que ficô
quano oiô minha fremosura,
falô que tava só de passage
mai foi ficano... ficano...

Home dereito, Santontonho,
home bão, carinhoso,
quano temo os doi juntinho
é só suspiro e contentura,
mai já faiz treze ano, meu santo,
que nóis só temo se namorano...

Quano eu falo em casório
o Juca logo desconversa,
diz que inda é muito cedo,
que num tem ninhuma pressa...

A curpa é minha, eu sei,
afiná, meu Santontonho,
só le pedi um amô,
só um arguém pra eu querê-bem.
Mai, será que o sinhô num pudiria
incruí no meu pidido
um bão marido tamém,
nem que pra isso eu tenha
que trocá o amô do Juca
pelo amô de otro arguém?

Atende eu, Santontonho!

                                                 Isabel Pakes

Imagem Google

quarta-feira, 8 de junho de 2011

 
Às candeias do amanhã


Ausente do meu toque, feito um anjo ou feito um bruxo,
me olhas do alto da lua, me beijas através da brisa
e nas rosas que admiras me mandas lembranças tuas.
Pareces estar vibrando em tudo quanto me envolve,
até nos livros que leio, como se teus mensageiros,
contam-me histórias de amor iguais à tua e a minha.

E isso não te bastando, interceptas meus pensamentos,
seduzes meus argumentos e, de pronto,
te colocas porta adentro dos meus sonhos.
De tal forma te embrenhas em minha mente
que não há como fugir dos teus enleios
                                               e nem tenho eu por quê.
Se às vezes me exasperas pelo ontem que adiaste,
outras vezes me comoves, muito, profundamente,
quando feito a canção que mais gosto,
vens, manso e cativo, aninhar-te no meu peito.

Alheio ao tempo e à distância
por onde vou me alcanças trespassando dimensões,
alongando os teus sentidos aos menores dos meus gestos,
guardando-me em calmaria, às candeias do amanhã,
em noite de turbilhão.

Se és um anjo ou um bruxo, não sei.
Se me guardas ou me enfeitiças, não sei.
Talvez em mim só preserves o alento
                                            em cuja sombra repousas.
Mas estás aí, é o que importa!
Estás aí e me ouves devotado
e sem que te apercebas, minha alma embevecida
por um breve instante me escapa para abraçar-se à tua.

Isabel Pakes


sexta-feira, 3 de junho de 2011




"Poesia é quando uma emoção encontra seu pensamento
 e o pensamento encontra palavras." Robert Frost




quarta-feira, 1 de junho de 2011

O eu anterior
                           Fernando Pessoa

Já fui outro em outra vida
antes desta e deste ser.
Quando a lua dos bosques vem
de fadas, gnomos encher,
um sonho aparece em mim,
qual luz brilhando sem fim
algures em mim, à distância,
em mares que então conhecia
e em terras sem lugar
onde o dia é outro dia.

Sonho, e tal como o sopro
que na brasa a chama faz,
meu peito acende um passado
que lembrar não sou capaz.
Como a brasa incandescente
em que o fogo é aparente,
gasto a riqueza vazia
de um mudo sentido, assim.
Como a chuva cai no mar,
esvaio-me dentro de mim.

Há labirintos de Eu.
Sou meu ser desconhecido.
Tenho, e não sei porquê,
Da visão outro sentido
(diferente da vã visão
de minha alma em cisão
com o que me cerca a vista)
onde ver é conhecer,
e a vida é fé e dor
que a dúvida faz correr.

Minha vida só é feliz
quando em mim não sinto vida;
tal como o aroma das flores
delas é alma tecida,
um espírito corporizado
de mim mesmo foi herdado,
espírito da minha alma
carne-aroma de dois Eus;
perda e riqueza do ser
que se partilha com Deus.